quarta-feira, 16 de dezembro de 2020

Após intensa mobilização, OAB aprova paridade de gênero e cotas raciais de 30%



A OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) aprovou, em reunião do Conselho Federal nesta segunda-feira (14), a implementação de paridade de gênero e de cotas raciais de 30% nos órgãos da entidade.

Ambas as propostas já valerão nas próximas eleições da OAB, em novembro de 2021. Ao longo dos últimos meses, houve intensa mobilização tanto da advocacia feminina quanto da advocacia negra pela aprovação das propostas.

Vale ressaltar que as propostas de cotas não têm relação com o sistema de aprovação no Exame da Ordem (requisito para atuar na advocacia). Elas se referem somente às chapas ou diretorias que comandam a entidade nos estados e nacionalmente.

Com a aprovação, a composição deverá ser de 50% de mulheres nas chapas para a direção da entidade e nos órgãos da estrutura interna da OAB.

Aprovada por unanimidade, a proposta de paridade de gênero foi apresentada pela conselheira da OAB-GO Valentina Jungmann Cintra.

Havia diferentes propostas referentes às cotas raciais. A aprovada foi apresentada pelo conselheiro da OAB-CE André Luiz de Souza Costa e determina a implementação de cotas de 30%, pelo período de dez eleições —30 anos—, para todos os órgãos da OAB, incluindo cargos de direção.

Um dos argumentos que reforçavam a campanha por paridade de gênero na entidade são os números: as mulheres já são praticamente 50% da advocacia brasileira.

A composição racial permanece uma incógnita. Uma das reivindicações é justamente a realização de um censo reunindo toda a advocacia. Segundo o presidente da OAB, Felipe Santa Cruz, o mapeamento deve ser realizado ainda durante sua gestão, conforme mencionado ao longo da reunião desta segunda-feira.

tema já tinha sido apreciado, em decisão consultiva, pelo Colégio de Presidentes da OAB em 1º de dezembro. Em reunião tensa, os presidentes votaram favoravelmente à paridade de gênero e ao estabelecimento de cotas raciais de 15% nos órgãos da entidade.​

Na ocasião, houve a tentativa de condicionar a aprovação da paridade de gênero à realização de um plebiscito com toda a advocacia, e a aprovação da cotas raciais à realização de um censo da advocacia. No entanto, as propostas foram barradas em votação.

Na reunião desta segunda-feira, a proposta de paridade de gênero sequer chegou a ser votada, sendo aprovada por aclamação.

Já a proposta de cotas raciais passou por duas rodadas de votações, dadas as diferentes sugestões sobre a mesa.

Em seu voto, o relator de uma das proposições, o conselheiro federal do Espírito Santo Jedson Marchesi Maioli, foi favorável à proposta de proporcionalidade racial, com a aplicação de cotas de 20% até que o censo da advocacia fosse realizado.

Segundo esta proposta, a composição das chapas deveria refletir de maneira proporcional a composição racial da advocacia de cada estado.

A proposta aprovada determina o mínimo de 30%, independentemente da composição local.

Parte dos conselheiros presentes, principalmente de estados da região Sul, apontou que, em determinadas subseções da OAB, não seria possível alcançar o percentual de 30% ou mesmo de 20%. Com isso, também entrou em votação se as cotas raciais não valeriam para as subseções menores.

Entretanto, a posição da maioria foi de que a regra aprovada deveria ser a que promovesse maior reparação possível à população negra, garantindo uma participação mínima na maior quantidade de órgãos e, para os casos excepcionais, como de subseções que não conseguirem atingir o percentual mínimo, haverá deliberação futura quanto a qual será a solução.

Depois de aprovada a cota de 30%, ainda houve uma nova votação, que contrapunha a proposta de 30% ao longo de dez eleições à sugestão de que, após o censo, os percentuais fossem readaptados.

Para parte das pessoas ouvidas pela reportagem, a nova votação foi vista como uma manobra para recolocar em votação proporcionalidade versus reserva de 30%.

Também nesta votação a proposta inicial do conselheiro André Costa foi a escolha da maioria. Algumas conselheiras defenderam, em seus votos, que nada impede que, após o censo, as OABs estaduais aumentem o percentual, mas que era importante garantir um percentual mínimo de participação.

Um dos conselheiros de Mato Grosso do Sul questionou se a proposta contemplava também a advocacia indígena, mas a informação dada foi de que o tema está tramitando em outro processo dentro da OAB, sob outro relator.

Também chegou a ser votado se as regras valeriam nas eleições de 2021 ou apenas no pleito de 2024.

O relator da proposta de cotas raciais, Jedson Marchesi Maioli, defendeu a aplicação do princípio da anualidade e que, portanto, em analogia à legislação eleitoral, as regras teriam que ser aprovadas até um ano antes do pleito.

A maioria entendeu, no entanto, que o princípio não deveria ser aplicado e, com isso, tanto a paridade de gênero quanto as cotas raciais valerão já no ano que vem.

De acordo com números da OAB, dos 81 conselheiros titulares da atual gestão, 61 são homens e 20 são mulheres.

Há no momento, entretanto, 23 conselheiras federais em exercício, devido a cadeiras que foram assumidas por suplentes.

Do ponto de vista racial, apenas um dos conselheiros federais é autodeclarado negro e não há nenhuma mulher negra. Também os atuais 27 presidentes das seccionais da OAB são homens brancos.

Daniela Borges, conselheira federal da OAB-BA e presidente da Comissão da Mulher Advogada, ressaltou a mobilização feita ao longo dos últimos meses pela aprovação da paridade de gênero.

"Nada disso seria possível sem o engajamento de cada conselheira federal em sua seccional. Nada a gente constrói sozinho, essa é uma conquista de todas as mulheres e homens que se engajaram nesse propósito. Todas as diretoras de seccionais. Podemos não ter nenhuma presidente de seccional mulher, mas temos 19 vice-presidentes aguerridas que efetivamete se comprometem com a pauta da representação das mulheres no sistema OAB", disse ela após a aprovação.

Já a presidente da Comissão Nacional da Promoção da Igualdade, Silvia Cerqueira, disse à Folha que a aprovação das medidas foi um marco histórico. "É um marco, é um divisor de águas da advocacia brasileira nacional, e isso fruto de muito trabalho, sobretudo na questão racial, porque na questão racial as resistências são muito maiores."

Ela também frisou a necessidade de fiscalização acerca da implementação das cotas. "Vencemos uma batalha, mas a luta continua, agora é uma outra etapa, para a efetividade da implementação das cotas raciais no seio do Conselho Federal [da entidade]."

Fonte: FOLHA

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