sábado, 30 de setembro de 2017

Não ver, não ouvir e calar sempre



Você quer ser querida pelos amigos, viver sem problemas, ser daquelas pessoas que são sempre lembradas com alegria e prazer? Em outras palavras: você quer ser feliz? Simples: esqueça essas manias de ver, ouvir e, sobretudo, falar, e sua vida passará a ser um mar de rosas.
Não ouça; isso mesmo, não ouça, salvo, talvez, um pouco de música, quando estiver no carro. Quando perceber que estão contando uma história escabrosa da área política, vá para a janela e olhe para fora com enorme atenção.

E se o assunto envolver a vida particular de quem quer que seja -e quanto mais próxima a pessoa, pior-, seja drástico e finja um mal-estar súbito. Se tiver que se explicar, diga, no máximo, que é vagotônico como era o poeta Vinicius, doença que, aliás, já esteve muito na moda e que ninguém nunca soube muito bem do que se tratava.

Agora, o principal: se uma amiga -principalmente se for a que você mais adora- quiser contar seus problemas pessoais, arranje uma desculpa, seja ela qual for, para não ouvir: simule uma crise nervosa, diga coisas desconexas, dê uns gritos, e se for preciso, desmaie, mesmo que esteja no meio da rua. Vale absolutamente tudo para não assumir o papel de confidente, pois vai acabar sobrando para você -ou estou dizendo alguma novidade?

Bem, já falamos do primeiro ponto: não ouvir. Agora vamos ao segundo: não ver.

Quando for a uma festa, use óculos, daqueles que os bandidos obrigam os sequestrados a usar -com vidro negro e opaco- para não enxergar; faça essa riquíssima experiência que é não ver absolutamente nada, a saber: quem deu um amasso em quem, de quem é a perna enroscada debaixo da mesa que você flagrou quando foi pegar o isqueiro que caiu no chão, ou as baixarias que costumam acontecer quando as pessoas se descontraem, digamos assim. E se não conseguir os tais óculos negros, não tem importância: é só passar a noite inteira de olhos fechados -ou não sair de casa, claro.

Agora, o terceiro ponto, muito, mas muito mais importante do que não ver e não ouvir: não falar.
Nunca diga nada sobre nenhum assunto, e não dê, jamais, uma só opinião sobre nada. Se alguém diz que a couve-flor está mais cara, ouça com o ar mais sério do mundo; se ouvir o contrário, também -e continue mudo. Não diga nada, não faça nenhuma ponderação, não emita um único som.

Renuncie a bancar o inteligente e fique até o sol raiar, se for preciso, de boca fechada, que é a posição correta na vida, como você já deve ter aprendido -ou devia.
Se alguém mencionar a crise política e tiver uma vontade súbita de dizer alguma coisa, morda a língua e não faça juízo a respeito de nada: nem sobre a queda -ou a alta- do dólar, nem, sobretudo, sobre a CPI. Opinião, nem pensar.

O maior perigo é quando sua maior amiga está passando por uma crise e pede um conselho.
As pessoas só querem que se diga o que elas querem ouvir, e há até quem ache que amigo só existe para dar razão quando não se tem razão -você não sabia?
E não tenha ilusões: diga você o que disser, contra ou a favor, no final a culpa será sempre sua. Aprenda, mesmo que já um pouco tarde, que a sabedoria da vida é não ver, não ouvir e calar.

O que significa, na prática, não viver -o que é meio triste, convenhamos.

Texto de Danuza Leão - Folha de São Paulo 

quinta-feira, 28 de setembro de 2017

Humildade




A humildade é uma das virtudes mais difíceis na vida. Principalmente porque está fora de moda, confundida com baixa autoestima. Somos ensinados a buscar o orgulho como autoafirmação. Nada mais distante de uma personalidade razoavelmente madura do que o orgulho.

A humildade é uma das virtudes bíblicas. O filósofo judeu Martin Buber, quando elenca em seu maravilhoso "Hasidism and Modern Man" (Prometheus Books), de 1988, as quatro principais virtudes do místico hassídico, coloca a humildade como a máxima entre elas.

O hassidismo é uma escola judaica típica do leste europeu dos séculos 18 e 19, e o termo vem da palavra hebraica "hesed", que pode ser traduzida por "piedade".
As quatro virtudes são: êxtase na contemplação ("hitlahavut"), trabalho ("avodá"), a intenção reta do coração ("kavaná") e a humildade ("shiflut"). Segundo ele, alguém que tem intimidade com D'us (no judaísmo, não se escreve o nome de Deus completo) tem gosto pelo trabalho, seja ele qual for, porque sente que ser parte do mundo é colaborar com ele.

O êxtase é o que acontece com quem vê D'us e sua piedade com frequência. O ato de contemplar D'us -a palavra "hitlahavut", em hebraico, remete ao fogo- "incendeia a alma". A intimidade com Deus leva o místico a não conseguir mentir aquilo que sente e pensa, ele diz. Daí a ideia de um coração reto.

Por fim, a humildade. As três anteriores convergem para o que Buber se refere como a consciência de que D'us carrega o mundo na palma da Sua mão, imagem comum na Bíblia hebraica (o Velho Testamento dos cristãos).

É comum personagens como Davi e Abraão usarem essa imagem ou similares para descrever a relação entre D'us e o mundo. A humildade é marca suprema da alma que se conhece sem mentir para si mesma.

A humildade também pode ser vista como grande virtude e desafio para pessoas distantes de qualquer sensibilidade religiosa, mas que têm grande sucesso na vida.
Se você é alguém que não teve sucesso na vida, dizer que é humilde é mais falta de opção do que qualquer virtude de fato. Por isso, a humildade sempre foi cobrada de grandes guerreiros e mulheres lindas.

O sucesso, seja ele físico, financeiro, intelectual ou "imaterial", sempre foi um desafio: o risco do sucesso é deformar a alma. Sobre isso, basta ver o horror que é o mundo intelectual e seu profundo desprezo (ao contrário do que querem transparecer) pelo "povo".

A chamada "segurança de si" vai melhor com a humildade do que com o self-marketing. Qualquer pessoa sabe que não se pode falar das próprias virtudes, porque o autoelogio é signo de desespero.

A humildade é o manto com o qual a alma virtuosa se cobre e esconde sua face. E isso nada tem a ver com tristeza ou falta de percepção do sucesso. A felicidade, quando verdadeira, é sempre uma forma de generosidade.

Assim como D'us esconde a sua face, segundo o hassidismo, para nos "proteger" de sua grandeza, o virtuoso esconde seu rosto "em chamas", seja ele incendiado por D'us, seja pelo sucesso, para que não saibam que ele está acima do homem comum.

Não é outro o sentido de se dizer, no cristianismo, que Jesus era um humilde. Qualquer homem comum que fosse alçado a condição de D'us seria um miserável orgulhoso.

Porém, existe um outro tipo de humildade, de que não se costuma falar muito, mas que considero tão essencial quanto o que é mais falado no mundo da filosofia moral. Trata-se da humildade da qual fala Freud. Estranho? Nem tanto. Na psicanálise, a humildade é também essencial.

O sábio de Viena dizia que se ele conseguisse levar seu paciente a trabalhar e a amar razoavelmente, estaria satisfeito como psicanalista.

Além do fato de que grande parte dos psicanalistas é tão horrorosamente orgulhosa quanto minha tribo de filósofos e afins (em alguns casos, o orgulho de alguns beira o grotesco), acho que essa fala de Freud não serve apenas para esses profissionais, mas também para os pacientes.

Muitas vezes, se concentrar em conseguir levantar de manhã e trabalhar, conseguir olhar para as pessoas à sua volta e ser generoso, pode ser o maior dos milagres na Terra. 

Texto: Luiz Felipe Pondé - Folha de São Paulo 2015 

quarta-feira, 27 de setembro de 2017

Seu momento Winston Churchill

Uma crise dessas pode servir para muita coisa. Inclusive nos transforma num grande líder. A crise impõe mudanças, que precisam ser bem lideradas para serem bem-sucedidas. Então, lidere copiando o que grandes líderes fizeram em grandes crises:



1 - Tome decisões duras. Este é o momento de enfrentarmos a realidade e resolvermos todas as questões delicadas que estávamos postergando por anos. Não vamos desperdiçar o senso de urgência que a crise traz. Tem gente que só larga o cigarro quando vai parar no médico com doença grave. A crise nos obriga a colocar o corpo da nossa empresa em forma.

2 - Chame o Falconi. É preciso lutar contra a pré-ocupação e incentivar a ocupação. A crise não pode paralisar a empresa. Ao contrário. É preciso se mexer, ganhar competitividade. O Brasil tem problema crítico de produtividade. É preciso investir em gestão para melhorar todos os processos. E quem mais entende disso no Brasil é o professor Falconi.

3 - Inove. Grandes inovações surgiram das dificuldades e das crises. Traga soluções novas para a sua empresa e para os seus clientes. Eles estão precisando. Não adianta se retrair achando que as coisas voltarão ao "business as usual". Não voltarão. Quem mudar na direção certa vai ganhar mercado de quem se apequenou e sairá da crise mais forte e preparado.

4 - Chame o Galeazzi. Os mestres dizem que reduzir as despesas deve ser atividade permanente. Na crise, é imperativa. O líder deve começar cortando suas próprias despesas, para poder exigir o mesmo da equipe. Mas é preciso saber cortar o que atrapalha e promover o que ajuda. O mestre disso no Brasil é o Galeazzi.

5 - Fique do lado dos clientes. Alguns dos meus clientes viram sua verba publicitária desaparecer, mas eu não vou desaparecer da frente deles porque a verba deles desapareceu. Este é o momento de trazer soluções. Até para a falta de verba.

6 - Limpe a agenda. Já que estamos em crise, vamos ter uma agenda de crise. Para isso, é indispensável limpar a agenda de tudo aquilo que é desnecessário e fixar o foco no que precisa ser focado. Tirei da minha agenda tudo o que era lateral, espuma. Essas coisas terão o seu tempo, mas primeiro a crise, ou melhor, as soluções para a crise.

7 - Comunique-se de forma clara com os funcionários. É preciso investir em endomarketing para mudar o clima e dar direção à empresa. Tenho cuidado dessa agenda pessoalmente, me comunicando de forma permanente com os colaboradores. As empresas hoje são canais abertos de comunicação. É hora de turbinar esses canais, falando de forma clara e constante e trazendo grandes mentes de fora para inspirar as equipes.

8 - Procure inspiração em outras indústrias e outros períodos. A história da humanidade e dos negócios pode ser contada por suas crises. Elas geram grandes transformações em todos os níveis. Não perca tempo buscando soluções que já foram encontradas. É preciso ler e apreender as experiências contadas todos os dias nos jornais e nas revistas. Esta Folha vem mostrando medidas que várias empresas estão tomando. Vamos aprender com elas.

9 - Incentive a vida saudável. Aprendi essa lição com grandes empresários e executivos que admiro e conheço. Por isso, sei que funciona. É preciso estimular a si e aos colaboradores a fazer exercícios, dormir bem, se alimentar de forma saudável. É preciso ter saúde, cabeça e resistência para enfrentar a crise. E cabeça boa se consegue com corpo em bom estado.

10 - Leia biografias de grandes homens. A crise é para os grandes. As biografias dos grandes homens são os maiores guias para as dificuldades que enfrentamos.
O que Olavo Setubal, Walter Moreira Salles, Abilio Diniz, Marcel Hermann Telles fizeram em grandes momentos como este? São grandes homens justamente porque não se apequenaram em momentos críticos. Ao contrário, se firmaram como líderes. Este pode ser o seu momento Winston Churchill, o homem que na hora mais dura construiu seu grande momento, sua "finest hour". 

Publicado na FOLHA DE SÃO PAULO EM 2015 

Autor: Nizan Guanaes

segunda-feira, 25 de setembro de 2017

O PERIGO DE NÃO SE RENOVAR




A cena é bem comum: o chefe convoca uma reunião, prometendo anunciar novas metas e planos para a empresa. Todos ficam ansiosos, cheios de expectativa. Mas quando o encontro acontece, o que se escuta é o mesmo discurso de sempre -o que só causa frustração e desânimo.

Muita gente nem sequer percebe, mas passa anos repetindo a mesma fórmula. Mesmo que o discurso ganhe novas palavras, jargões da moda e até alguns termos em inglês, o que se vê ali não deixa de ser a mesmíssima ideia de antes, agora desgastada pelo tempo.

Esse é o grande perigo que se corre ao não renovar nem seus conhecimentos nem suas companhias.

Ao conviver no mesmo meio, com pessoas parecidas, sem nunca sair dessa bolha para aprender coisas novas, você chegará a um dos seguintes resultados: vai reciclar conceitos do passado ou imitar quem está ao seu lado.

Nenhuma das duas alternativas é boa para sua carreira. Ninguém quer ter por perto alguém que não tem nada de novo a dizer. E uma pessoa que pensa exatamente como os outros também não se destaca nem contribui, podendo ser facilmente substituída.

Para fazer algo diferente, é preciso olhar o mercado de forma diferente, ter uma postura diferente e aprender todos os dias.

Passamos muito tempo discutindo coisas que não vão levar a nenhum resultado. Isso porque, normalmente, discutimos com as mesmas pessoas, sobre os mesmos temas, com os mesmos argumentos.

Alguns líderes realmente não sabem o que fazer. Só ficam girando em círculos. Eles não buscam novos conhecimentos, não trazem propostas claras, defendem o seu departamento e ficam apenas se justificando, quando na verdade deveriam reconhecer que precisam aprender coisas novas.

Temos que ter coragem para mudar, reconhecer que precisamos percorrer outros caminhos, encarar novos desafios, sofrer quando não atingirmos os resultados e assumir a responsabilidade por aquilo que não foi feito, seja por falta de esforço ou de conhecimento.

E nem venha me dizer que não há motivação para ir atrás do aprendizado e da mudança. O primeiro impulso vem da consciência. A motivação, aquele gás que te deixa animado e feliz, só aparece com força depois que os primeiros resultados são atingidos.

Quanto mais resultados alcançar, mais motivado ficará.

Texto: Américo José - É consultor de empresas e palestrante há mais de 20 anos.  

FOLHA DE SÃO PAULO 

sábado, 23 de setembro de 2017

DIVIRTA-SE



O que o fósforo falou para o cigarro?

Por sua causa, perdi a cabeça.

Qual é o cúmulo da higiene mental?



Lavar a alma.
  
O que o polvo falou para o filhinho?

Dá a mão, dá a mão, dá a mão…

Por que a planta não fala quando é pequena?

Porque ela ainda é uma mudinha.
  
Por que o time de basquete contratou um sapo?

Por que ele sempre acerta na mosca

O que a escola de samba foi fazer na biblioteca?

Lê  lê l lê

Qual a semelhança entre o professor e o termômetro

De vez em quando eles dão zero

O que aconteceu com o ferro de passar roupa quando caiu no chão?


Ficou passando mal

quarta-feira, 20 de setembro de 2017

A felicidade segundo Martha Medeiros

Descobrir. Está aí um verbo que me permito conjugar sempre. Ele pressupõe que ninguém deve se sentir constrangido por não saber alguma coisa. Sua essência é exatamente esta: a novidade, a delícia de descortinar o novo.
Nesse caso, o novo para mim é a escritora gaúcha Martha Medeiros, minha mais recente (e confesso, tardia) descoberta literária. Foi por meio do livro “Que Ninguém nos Ouça”, de Leila Ferreira e Cris Guerra, que pela primeira vez li um texto dela, que assina o prefácio.
Eu, mais tendencioso à leitura para o espírito, me rendi à força das palavras desta brasileira de Porto Alegre: um jeito leve e intenso, passional e, ao mesmo tempo, equilibrado de escrever sobre o mundo, as relações, a natureza, as pessoas, a poesia. De mostrar que o prazer está na invenção da alegria que criamos para nós mesmos. De que temos de fazer o necessário para sermos felizes. De escancarar que a felicidade é algo tão simples que pode passar sem ser percebida.
Martha é pólvora. É ligada na tomada, mas sabe bem onde gasta e direciona sua energia. Questiona a felicidade sem sabotá-la, pede um olhar treinado para que a encontremos na delicadeza das coisas, desanuviando-nos da rudeza dos vícios. “A vida não é um questionário de Proust. Você não precisa ter de responder ao mundo quais são as suas qualidades, sua cor preferida, seu prato favorito, que bicho seria. Que mania de se autoconhecer. Chega de se autoconhecer. Você é o que é, um imperfeito bem-intencionado e que muda de opinião sem a menor culpa. Feliz por nada talvez seja isso.”
Do seu primeiro livro, “Striptease”, de 1985, até o mais recente “Um Lugar na Janela 2”, de 2016, a ecologia da felicidade é tema recorrente nas obras da escritora, que também é colunista do jornal Zero Hora. Martha nos aponta o caminho em que, no fim das contas, felicidade mesmo é viver. E dá um conselho: “Viver é a nossa única opção real. Antes de nascermos, era o nada. Depois, virá mais uma infinidade de nada. Essa merrequinha de tempo entre os dois nadas é um presentaço. Não seja louco de desperdiçar”. Eu não sou, Martha. E acredito que a maioria das pessoas gosta, e muito, de viver.
Descobrir e gostar. Estão aí dois verbos que você, caro leitor, cara leitora, facilmente encontrará cada vez que abrir um livro de Martha Medeiros.
Aprecie a seguir o chimarrão literário de boas reflexões e pensamentos que a escritora tem nos 
oferecido:


Viver
“Viver é uma arte. A arte de conversar com desconhecidos, por exemplo. De se revelar em poucas palavras para uma pessoa que não sabe nada sobre você, e você nada sobre ela, e estabelecer um contato que seja agradável e frutífero para ambas as partes, evitando silêncios constrangedores ou, pior, o sono.”

Tempo
“O tempo não cura tudo. Aliás, o tempo não cura nada. O tempo apenas tira o incurável do centro das atenções.”

Virgindade
“Quando falamos em virgindade, logo pensamos em sexo, e a partir do dia que o experimentamos, o mundo parece perder seu mistério maior. Não somos mais virgens – que ilusão de maturidade.”
“Virgindade é um conceito um tanto mais elástico. Somos virgens antes de voltar sozinhos do colégio pela primeira vez. Somos virgens antes do primeiro gole de vinho. Somos virgens antes de conhecer Nova York. Somos virgens antes do primeiro salário. E podemos já estar transando há anos e permanecermos virgens diante de um novo amor.”

Morte
“Morre lentamente quem não troca de ideias, não troca de discurso, evita as próprias contradições.”
“Morre lentamente quem não vira a mesa quando está infeliz no trabalho, quem não arrisca o certo pelo incerto atrás de um sonho, quem não se permite, uma vez na vida, fugir de conselhos sensatos.”
“Morre lentamente quem passa os dias se queixando da má sorte ou da chuva incessante, desistindo de um projeto antes de iniciá-lo, não perguntando sobre um assunto que desconhece e não respondendo quando lhe indagam o que sabe. Morre muita gente lentamente, e esta é a morte mais ingrata e traiçoeira, pois quando ela se aproxima de verdade, aí já estamos muito destreinados para percorrer o pouco tempo restante.”

Lazer e prazer
“São duas palavras que rimam e se assemelham no significado, mas não se substituem. É muito mais fácil conquistar o lazer do que o prazer. Lazer é assistir a um show, cuidar de um jardim, ouvir um disco, namorar, bater papo. Lazer é tudo o que não é dever.”
“O prazer não está em dedicar um tempo programado para o ócio. O prazer é residente. Está dentro de nós, na maneira como a gente se relaciona com o mundo.”
“O prazer está em tudo o que fazemos sem atender a pedidos. Está no silêncio, no espírito, está menos na mão única e mais na mão dupla.”

Inveja
“Apenas se sentem agredidos aqueles que te invejam.”

Idade
“Não importa a idade que temos, há sempre um momento em que é preciso chamar um adulto.”

Afinidade
“É importante cultivar afinidades, mas as desafinações ensinam bastante. No mínimo, nos fazem dar boas risadas. Vale amizade com executivo e com office-boy, com solteiros e casados, meninas e mulheraços, gente que torce para outro time e vota em outro partido. Vale sempre que houver troca.”

Felicidade
“Ser feliz de uma forma realista é fazer o possível e aceitar o improvável.”
“Felicidade é a combinação de sorte com escolhas bem feitas.”

Vida
“A vida não é um game onde só quem testa seus limites é que leva o prêmio. Não sejamos vítimas ingênuas desta tal competitividade. Se a meta está alta demais, reduza-a. Se você não está de acordo com as regras, demita-se. Invente seu próprio jogo.”
“Pessoas com vidas interessantes não têm fricote. Elas trocam de cidade. Investem em projeto sem garantia. Interessam-se por gente que é o oposto delas. Pedem demissão sem ter outro emprego em vista. Aceitam um convite para fazer o que nunca fizeram. Estão dispostas a mudar de cor preferida, de prato predileto. Começam do zero inúmeras vezes. Não se assustam com a passagem do tempo. Sobem no palco, tosam o cabelo, fazem loucuras por amor, compram passagens só de ida.”
“Uma vida sem amigos é uma vida vazia. O mundo é muito maior que a sala e a cozinha do nosso apartamento. A arte proporciona um sem-número de viagens essenciais ao espírito. Amar é disparado a coisa mais importante que existe.”
“Desmediocrize sua vida. Procure seus ‘desaparecidos’, resgate seus afetos. Aprenda com quem tiver algo a ensinar, e ensine algo àqueles que estão engessados em suas teses de certo e errado.”

O novo
“Procura-se, vivo: o novo. Morto não interessa. Procura-se a novidade que vai fazer o povo refletir, questionar, enlouquecer. Algo nunca visto, original, que desestruture, surpreenda, revolucione.”
“Raios, temos que ser novos. Não se pode repetir fórmulas, não se pode reprisar o que dá certo, ficam proibidos todos os prazeres conhecidos. Música, literatura, cinema, moda, reinventem-se. Ai de quem não ousar.”
“Fazer diferente, impressionar. Nada de ser lírico, nada de ser cru, transgrida, provoque a crítica, provoque o público, não caia no gosto popular, não seja excêntrico, não seja petulante, não seja o mesmo, não tenha estilo, não finja ser o que não é, não seja excessivamente confessional.”
“Reclamar do tédio é fácil, difícil é levantar da cadeira para fazer alguma coisa que nunca se fez.”

O mundo
“O mundo não se importa se estamos desagasalhados e passando fome. Não liga se virarmos a noite na rua, não dá a mínima se estamos acompanhados por maus elementos. O mundo quer defender o seu, não o nosso.”
“O mundo quer que a gente fique horas no telefone, torrando dinheiro. Quer que a gente case logo e compre um apartamento que vai nos deixar endividados por vinte anos. O mundo quer que a gente ande na moda, que a gente troque de carro, que a gente tenha boa aparência e estoure o cartão de crédito.”
“O mundo nos olha superficialmente. Não consegue enxergar através. Não detecta nossa tristeza, nosso queixo que treme, nosso abatimento.”

Deus
“Deus não está em promoção, se exibindo por aí. Ele escolhe, dentro do mais rigoroso critério, os momentos de aparecer pra gente. Não sendo visível aos olhos, ele dá preferência à sensibilidade como via de acesso a nós. Não sou católica praticante e ritualística – não vou à missa. Mas valorizo essas aparições como se fosse a chegada de uma visita ilustre, que me dá sossego à alma.”
“Deus me aparece – muito! – quando estou em frente ao mar. Tivemos um papo longo, cerca de um mês atrás, quando havia somente as ondas entre mim e Ele. A gente se entende em meio ao azul, que seria a cor de Deus, se ele tivesse uma.”

Abraço
“Somando os prós e os contras, as boas e más opções, onde, afinal, é o melhor lugar do mundo? Que lugar melhor para uma criança, para um idoso, para uma mulher apaixonada, para um adolescente com medo, para um doente, para alguém solitário? Dentro de um abraço é sempre quente, é sempre seguro. Dentro de um abraço não se ouve o tic-tac dos relógios e, se faltar luz, tanto melhor. Tudo o que você pensa e sofre, dentro de um abraço se dissolve.”

Gentileza
“Seja gentil, mas não a ponto de perder o tino. Se tiver que ferir suscetibilidades para salvar sua pele, paciência. Atravesse a rua. Desça pela escada. Dê no pé.

Sucesso
“Sucesso é chegar em casa com vida.”

Discrição
“Não fale, não conte detalhes, não satisfaça a curiosidade alheia. A imaginação dos outros já é difamatória que chegue.”

Liberdade
“Não subestime os outros, nem os idolatre demais. Seja educada, mas não certinha. Faça coisas que nunca imaginou antes. Não minta, nem conte toda a verdade. Dance sozinha quando ninguém estiver olhando. Divirta-se enquanto seu lobo não vem.”
“Tenho juízo, mas não faço tudo certo. Afinal, todo paraíso precisa de um pouco de inferno.” 

Fonte: REVISTA ECOLÒGICO


FELIZ 2021